Embrenhei-me nas montanhas sobranceiras à Paiva ( rio Paiva) a que eu gosto de chamar no feminino) e não sei se venho dos lados da serra de Montemuro ou se me deixei ficar numa das aldeias dispersas pelos montes. Sei que ao ler esta escrita, mergulho nesse mundo rural quase esquecido mas depositário de belezas raras, de cheiros inimagináveis, palco... sobrevivente às imensas cenas ali representadas ao longo de séculos. Quase todos partiram deixando a terra ao abandono, quase sozinha nessa luta desesperada contra a desertificação.
Há casas abandonadas, ruas inteiras onde só o vento caminha solitário. Há roseiras em beirais que deixaram há muito de ter água, há campos onde o arado não rasga a terra outrora produtora de pão. Há fantasmas a percorrer as noites, sombras de gente que já não mora ali mas deixa o pensamento regressar em busca de um tempo feliz ali vivido. Ás vezes percorro esse espaço para sentir o clamor das saudades, ver de perto, ser testemunha ao menos, da agonia de um país que deixou de honrar-se a si próprio e perdeu as referências maiores da sua história. Se me ponho a pensar em tudo sentado numa pedra à beira da Paiva, é por que por mais que tente encontrar explicação para semelhantes crimes, nada de nada me ocorre perante a realidade que me cerca.
Esta é a reflexão que me aparece ao ler este texto, o acenar de cabeça de quem concorda com a escrita. Palavras, são apenas palavras mas têm o poder de despertar a história de um povo.
Deixo a serra ou vale onde corre um rio que não é o meu com a certeza que a Paiva, mais hora menos hora, há-de encontrar-se com o Douro e então este rio que é o meu, vai saber de tudo o que se passa nas montanhas.
Manuel Araújo da Cunha
http://dourointeiro.blogspot.com
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