Há sempre um novo caminho que se apresenta com outros sons, outros
cheiros, outras vozes como que a dizer, entra, mas fico sempre com esta
sensação de não ter o dever cumprido e penso que seria melhor voltar. O sol já
se pôs, lá em casa janta-se cedo e perco aquele rebuliço da aldeia dos fins de
tarde:
- Os animais que regressam dos campos, já fartos, parece que o seu destino é contar todos os dias as pedras da calçada. Olhos para o chão, campainhas a tilintar. São estas que me acordam manhã cedo, que por vezes me parecem melodias de outros tempos em que os sinos tocavam às almas.
- As mulheres com os canecos de água à cabeça, vão preparar o caldo, e mais alguma coisita para aconchegar o estômago.
- As crianças lançam-me aquele olhar que tão bem conheço, sempre que via chegar alguém da cidade. Muitas vezes ainda com a cara suja de terra ou e amoras esborrachadas na pele. Veem de ajudar os pais, ou então de alguma brincadeira. Trazem todos, um cheiro a terra, a erva, ou a urzes e a alecrim do monte.
Lembro-me tão bem destes olhares de há já tantos anos. Ficava encostada
a um canto, sem nada dizer, mas observando os gestos, ouvindo com atenção as
conversas dos chegados de Lisboa. Os Lisboetas, era como lhes chamavam. Há uma
magia que me leva para outros mundos, lugares fundos e mal amanhados, mas
muitas vezes não sei explicar, porque me detenho perante uma simples pedra mal
arrumada no caminho. Lembro quase sempre da minha avó, quando conduzia os
carros carregados, ou de estrume para adubar as terras, ou de mato para forrar
o chão dos currais dos animais, preocupada com tudo o que os impedisse de poder
subir as calçadas.
Agora neste caminho fundo que me irá levar por
entre os pinheiros, os castanheiros e os sobreiros, só se ouve o canto dos
pássaros. O canto do cuco estridente, umas vezes, vai deslizando suavemente,
por cima das copas dos pinheiros mais altos. Lanço um olhar breve ao céu
que começa agora a mudar de cor. Ainda não é desta que vou conseguir alcançar o
canto do cuco. Será melhor regressar à aldeia. Quem sabe o que me esperará por
lá. O sol só escondeu-se faz pouco tempo. Ainda vejo uma mancha dourada no monte
da aldeia vizinha - Desfeita.
Sem comentários:
Enviar um comentário