Há quem escreva
para o povo
do povo
há ainda quem escreva
sobre o povo
mas eu sou simplesmente
um verso
no meio do povo
Por isso
sigo esta viagem
da alma
por caminho incerto
nem sempre
cuidando desta minha fé
enraizada no mesmo chão
onde andei descalça
enterrei sementes
na mesma terra
onde nasci tal como vós
POVO
Brinquei e contei
pedras no rio
o mesmo onde as correntes
são vadias
mas não vazias
Há quem espere
em agonias
pelo povo
porque só ele
é o sustento
de tantas fomes
no meio dos montes
Por isso
eu não escrevo
para o povo
nem do povo
e sequer
sobre o povo
SOU POVO
Que importa isso agora
se tudo o que escrevesse
não seria nada de novo
que rimasse com povo...
Nem sequer serviria para nada
porque o nada
habita nas palavras
e estas por sua vez
já foram
tal uma cesta de vime
VAZIA
Que importa escrever
para o povo
se povo já eu sou
na inverosímil
mas devida
omnipresença
Por isso
escrevo para os outros
que do povo
bebem histórias
e à semelhança do pão
se ajoelham no chão
para a sagração
da sua própria convicção
Não me peçam palavras novas
que do povo nascem sempre
as mais carismáticas
quando por força maior
se quedam junto dos Santos
e estes as inspiram
para a nova ordem das coisas
Escrevo sim
palavras do coração
a linguagem da mãe
e que por ligação
ao pai
fecundam os versos
os poemas e as prosas
Por isso
sou assim
perante a vossa
indiferença
a alma que segue
pelos campos
que no rio se alimenta
quando da chegada
de novas correntes
que são os meus olhos
o meu corpo
e até o meu pensamento
enquanto os outros
tentam decifrar códigos
por entre as palavras
que escrevo
Dolores Marques
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