domingo, 26 de dezembro de 2021

Imagino um cenário

 Imagino um cenário contrário à corrente

moribunda na outra margem,

do outro lado do rio, do outro lado 

do seu próprio enredo imaginado

 

Como estará a minha linda Serra 

dantes revestida de prosas virtuosas

emolduradas pela poesia 

de vozes antigas ?


Que é das paisagens graníticas 

e do  rio 

e das fontes

e dos penedos

e das águas pelos campos

a jorrarem a  verdade das nascentes?


Que é do sermão por quanta desgraça colada nas paredes de xisto

a escorrer-se em lamentos

pelos males de outrora ?


Sofrem castigados pelos ventos, 

os pés, 

pegadas no ventre do monte indigente  


Descalços, vão...

e as vozes altas também são 

crentes no voo dos falcões 

com novos versos arremessados de além mar

por não saberem navegar em rios calmos e transparentes


A poesia derrama-se em silêncios escusos

por monte e vales 

por inconsequentes gestos defraudados 

nos dedos incertos trancados nas mãos


Abrem a boca à hóstia sagrada

esborrachada no céu da boca

como quem come feijões com couves tronchas

e morde ao de leve a pele do salpicão da língua


Respiram odores bravios, as pedras das Igrejas

rabiscadas com boas novas dos tempos antigos

e em água benta se baptizam todos os crentes

e os não crentes no Verbo

que dá voz à poesia de um tempo passado

que já não é tempo para ninguém


Dolores Marques

(A minha aldeia é Moção mas vejo todas elas com um os mesmos olhos)



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